Para aqueles que estão chegando agora: se gostar e quiser entender melhor o Budismo Tântrico e a Canção de Mahamudra, do Buda Tilopa, procure nas postagens anteriores por mais informações...
Lembre-se sempre: o visível jamais é a raiz. A raiz sempre permanece invisível, a raiz está sempre oculta. Nunca lute contra o visível, pois estará lutando contra sombras. Será em vão, só com isso não poderá haver nenhuma transformação em sua vida. Os mesmos problemas aflorarão novamente, novamente e novamente. Observe sua própria vida e verá o que eu quero dizer. Nao estou falando de teoria alguma sobre a mente, mas sobre a "artificialidade" da mente. Este é o fato: é preciso resolver a mente.
Pensamentos individuais existem, mas seu movimento é táo rápido que não se pode ver brechas entre eles. Os intervalos entre eles não podem ser vistos porque não se está consciente e alerta; precisa-se de uma visão interior mais profunda. Quando seus olhos puderem ver profundamente, verá, subitamente, um pensamento, outro pensamento e ainda um outro pensamento, mas não verá a mente.
Pensamentos reunidos, milhões de pensamentos, dão a ilusão de que a mente existe: como uma multidão, milhões de pessoas em pé, em multidão; há tal coisa, uma “multidão”? Pode-se encontrar a “multidão” separada dos indivíduos que ali estão? Mas estão reunidos e a reunião faz com que se sinta que existe algo que é “multidão” — mas só indivíduos existem.
Este é o primeiro olhar interior para a mente. Observe e encontrará pensamentos, mas nunca vai se deparar com a mente. E, se isso se tornar uma experiência sua — não porque alguém está dizendo, não porque Tilopa canta a esse respeito, só isso não ajudaria muito —, mas se isso se tornar a sua própria experiência, se isso se tornar um fato de seu
próprio conhecimento, então, subitamente, muitas coisas começarão a se modificar. Porque terá compreendido algo tão profundo sobre a sua mente, que muitas coisas podem seguir-se a isso.
Observe a mente e veja onde ela está, o que ela é. Vai notar pensamentos flutuando e intervalos. E, se observar por bastante tempo, verá que os intervalos existem em maior número do que os pensamentos, porque cada pensamento precisa estar separado de outro pensamento. De fato, cada palavra precisa estar separada de outra palavra. Quanto mais profundamente se for, mais e maiores brechas serão encontradas. Um pensamento flutua e, então, surge uma brecha onde não existe pensamento. Então surge outro pensamento e outra brecha se segue.
Se estiver inconsciente, não se poderá ver os intervalos, as brechas. Salta-se de um pensamento a outro e nunca se verá a brecha, o intervalo. Se se tornar consciente, verá cada vez mais brechas. Se se tornar perfeitamente consciente, então, milhares de intervalos serão revelados.
E nesses intervalos, acontece o satori.
Nesses intervalos, a Verdade bate à sua porta.
Nesses intervalos, o hóspede vem.
Nesses intervalos, Deus é compreendido,
ou a forma, seja lá qual for, em que se expresse tal coisa.
Então, a percepção é absoluta,
então, haverá apenas um vago intervalo de desligamento.
Observe as nuvens: as nuvens movem-se e podem ser tão densas que não se consegue ver o céu através delas. A vasta extensão azul do céu está perdida e fica-se coberto pelas nuvens. Então, continue a observar: uma nuvem se move e outra ainda não chegou ao seu campo de visão — subitamente, há um ponto na vastidão azul do céu.
O mesmo acontece interiormente: cada um é a vastidão azulada do céu, e os pensamentos são nuvens pairando em torno de si, entrando em cada um. Mas os intervalos existem, o céu existe. Ter um vislumbre do céu é satori; tornar-se o céu é samadhi. De satori a samadhi, todo o processo é uma profunda visão interior para a mente; nada mais.
Em primeiro lugar: a mente não existe como uma entidade; apenas os pensamentos existem. Em segundo lugar: os pensamentos existem separados de si; não são ligados à sua natureza. Eles vêm e vão – a gente permanece, persiste. Cada um é como o céu: nunca vem, nunca vai, está sempre ali. Nuvens podem ir e vir, são fenômenos momentâneos. Mesmo que se tentasse agarrar-se a um pensamento, não o poderia reter por muito tempo. Ele tem de ir, tem seu próprio nascimento e morte. Os pensamentos não são seus, não lhe pertencem. Chegam como visitantes, hóspedes, mas não são o hospedeiro.
Observe mais profundamente e se tornará o hospedeiro e terá os pensamentos como hóspedes. Como hóspedes, eles são belos; mas esquece-se completamente que cada um é o hospedeiro, e eles se tornam os hospedeiros e fica-se em confusão. Isso é o inferno. A pessoa é o dono da casa, a casa lhe pertence, mas os hóspedes se tornaram donos. Receba-os, cuide deles, mas não se identifique com eles; de outra maneira, eles se farão os senhores.
A mente torna-se problema porque toma-se os pensamentos tão profundamente, dentro de si, que esquece-se por completo a distância, o fato de eles serem visitantes, de irem e virem. Lembre-se, sempre, AQUILO que é duradouro: o que é a sua natureza, o seu Tao. Fique sempre atento ao que nunca vem e nunca se vai, tal como o céu. Mude o entendimento: não faça dos visitantes o seu foco; permaneça enraizado no hospedeiro. Os visitantes vão e vêm.
Há, naturalmente, bons e maus visitantes, mas não precisa preocupar-se com eles. Um bom hospedeiro trata todos os hóspedes da mesma maneira, sem fazer distinções. Um bom hospedeiro é apenas um bom hospedeiro: quando um mau pensamento surge, ele trata o mau pensamento da mesma forma como trataria um bom pensamento.
Não é de sua competência julgar o pensamento bom ou mau.
Que se está fazendo quando distingue-se este pensamento como bom e aquele como mau? Está se trazendo o bom pensamento para mais junto de si, e empurrando para longe o mau pensamento. Mais cedo, mais tarde, estará identificado com o bom pensamento, que passará a ser o hospedeiro. E qualquer pensamento, quando se torna hospedeiro, cria sofrimento — porque não é a verdade. O pensamento é um simulador, e a gente se identifica com ele. A identificação é doença.
O cientista (e filósofo, religioso) Gurdjieff costumava dizer que só uma coisa é necessária: não se identificar com o que vem e vai. A manhã vem, depois dela o meio-dia, vem a tarde, e todos eles se vão. Chega a noite e, novamente, a manhã. A gente permanece — não como mente, porque isso também é um pensamento, mas como pura percepção. Não o seu nome, porque isso também é um pensamento; não sua forma, porque isso também é um pensamento; não seu corpo, porque um dia compreenderá que também ele é um pensamento.
Apenas pura percepção, sem nome, sem forma: somente a pureza, somente o que não tem forma nem nome, somente o próprio fenômeno de estar consciente – só isso é duradouro.
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